terça-feira, 31 de maio de 2011

A Apologética Clássica de Anselmo


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Nasceu em Aosta (1033-1109), Piemonte (Itália). Tornou-se prior num mosteiro benedito e mais tarde foi designado arcepispo de Cantuária (1093). Suas principais obras são: Proslogion, Monologion, Cur Deus homo, e Da Verdade.

Folosoficamente, as idéias de Anselmo foram moldadas por Platão (428-348 a.C.). Teologicamente, as obras de Agostinho (354-430 d.C.) formam a base de seu pensamento. Mesmo assim, Anselmo foi um pensador original que criou um dos argumentos mais criativos, controversos e duradouros a favor da existência de Deus - o argumento Ontológico.

Em Cur Deus homo Anselmo deixou claro que a razão deve ser usada para explicar e defender o Cristianismo. Ele afirmou que é possível revelar ''na sua verdadeira racionalidade, os aspéctos da fé cristã que parecem impróprios e impossíveis para os incrédulos''. [1]

Até mesmo doutrinas como a Trindade e a Encarnação, Anselmo considerava ''aceitáveis e incontestáveis''. Ele via o papel duplo da razão. Primeiramente, ele falou em escrever a prova de certa doutrina da nossa fé ''que estou acostumado a dar aos indagadores''. Isso, disse ele:

''Não para que alcançem a fé por meio da razão, mas para que possam regozija-se ao entender e meditar nas coisas em que acreditam; e que, estejam sempre prontos para convencer qualquer um que exigir deles uma razão para a esperança que está em nós'' [2]

Os argumentos de estilo cosmológico de Anselmo.

Anselmo argumentou a partir da bondade em direção a Deus:

1. Coisas boas existem;
2. A causa dessa bondade pode ser uma ou várias;
3. Mas não pode ser múltipla, senão, não haveria como comparar a bondade, pois todas as coisas seriam igualmente boas. Porém, algumas coisas são melhores que outras.
4. Portanto, o Sumo Bem (Deus) causa a bondade de todas as coisas boas.

Anselmo argumentou a partir da perfeição em direção a Deus, um argumento que C. S. Lewis usou em Cristianismo Puro e Simples:

1. Alguns seres estão mais próximos da perfeição que outros;
2. Porém, as coisas não podem ser mais ou menos perfeitas a não ser que haja uma perfeição absoluta para fazer a comparação;
3. Portanto, deve haver um Ser absolutamente Perfeito (Deus).

Os argumentos ontológicos de Anselmo.

A contribuição mais famosa de Anselmo foram seus argumentos ontológicos, apesar de o próprio Anselmo não tê-los chamado assim. A primeira forma do argumento ontológico de Anselmo partia da idéia de um ser absolutamente perfeito. Ele assume a seguinte forma:

1. Deus é por definição aquele em relação a quem nada maior pode ser imaginado;
2. O que existe na realidade é maior que o que existe apenas na mente;
3. Portanto, Deus deve existir na realidade. Se ele não existisse, não seria o maior possível.

A segunda forma de argumento ontológico emergiu do debate amigável de Anselmo com outro monge chamado Gaunilo. Ele se dá a partir da idéia do Ser Necessário:

1. Deus é por definição o Ser Necessário;
2. É logicamente necessário afirmar o que é necessário a respeito do conceito do Ser Necessário;
3. A existência é logicamente necessária para o conceito de Ser Necessário;
4. Portanto, o Ser Necessário (Deus) existe necessariamente.

Seja qual for seu merito, o argumento teve uma carreira longa e ilustre e ainda está vivo um milênio mais tarde.

A popularidade de Anselmo, especialmente por causa do argumento ontológico, continua, apesar de opositores como Hume e Kant. Anselmo teve um impacto positivo em muitos pensadores modernos e contemporâneos, incluindo René Descartes, Baruch Espinosa, Charles Hartshorne, Norman Malcolm e Alvin Plantinga.

Conclusão:
Anselmo é o modelo de apologética clássica ou tradicional. Acreditava na apresentação de provas da existência de Deus. Ele é a antítese do fideísmo e da apologética puramente pressuposicional. Seus argumentos são fortemente úteis nos dias de hoje, para se defender a existência de Deus.


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Referências:

NORMAN GEILER, Enciclopédia de Apologética, editora Vida, p. 43-45
[1] ANSELMO, Cur Deus homo, 2.15
[2] Idem. 1.1

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Deus muda?


                                 [Para mais informações ver ''Objeções Ateístas'', no Indice do Blog]


Os ateus são rápidos, num debate, a apontar os ''arrependimentos'' de Deus registrados na Bíblia. Por exemplo, em Gênesis 6:3, é dito ''Então, arrependeu-se Deus de haver feito o homem sobre a terra, e pesou-lhe em seu coração''.

Também, em Êxodo 32:14, é registrado que ''o Senhor arrpendeu-se do mal que planejava fazer ao seu povo'', atendendo as súplicas de Moisés. Geralmente, o ateu apelará para uma dessas duas coisas:

• (a) ''Contradição'' na Bíblia. O argumento dele virá basicamente assim:

''Como posso acreditar na Bíblia, se ela diz que Deus não se arrepende (Nm 23:19; I Sm 15:29), e nem muda (Ml 3:3; Tg 1:17; Hb 6:17), mas aqui nessa passagem [ele provavelmente mostrará Gênesis 6:3 ou Êxodo 32:14] diz que ele se arrependeu? Hahaha!''

Ou

• (b) Negar a existência de Deus. Será basicamente assim:

''Como posso crer no seu D-us, ele se arrepende! D-uzinho imprevisível esse o seu! Por isso eu acredito que ele não existe. Hahaha!''

Apesar de serem estupidamente ilógicos, merece um esclarecimento. Será que Deus muda? Analisemos o conjunto de preposições abaixo:

I - Mudança exige tempo.

1. Para que uma mudança ocorra, algo tem que ser feito numa ordem cronológica;
2. Tem de haver um ponto antes e um ponto depois da mudança;
3. Tudo o que passa por um ''antes'' e um ''depois'' existe no tempo;
4. Deus é eterno, e está fora do tempo (Sl 90:2; 102:27; II Tm 1:9);
5) Se Ele é eterno, não pode haver em Deus uma série de ''anteriores'' e ''posteriores'';
6) Logo, Deus não pode mudar, porque a mudança necssariamente envolve um ''antes'' e um ''depois''.

II - Mudança exige melhorias ou perdas.

1. Toda mudança é para uma situaação melhor ou pior, pois uma mudança que não faça diferença não é uma mudança;
2. Ou alguma coisa necessária é obtida, a qual anteriormente não se fazia presente, ou alguma coisa que se tem e que é necessária é perdida, o que é uma mudança para pior;
3. Mas, se Deus é perfeito, ele de nada necessita;
4. Portanto, ele não pode mudar para melhor. E se Deus fosse perder alguma coisa, ele não permaneceria perfeito. Portanto, ele não pode mudar para pior. Assim, Deus não muda.

III - Mudança exige novas informações.

1. Quando alguém muda de idéia, é porque recebeu uma nova informação, da qual não tinha conhecimento anteriormente; ou porque as circunstâncias mudaram, de forma a requerer uma atitude ou ação diferente;
2. Se Deus mudou de idéia, não pode ser porque ele ficou sabendo de qualquer nova informação que desconhecia anteriormente, porque Deus é Onisciente - ele sabe de todas as coisas (Sl 147:5);
3. Portanto, tem de ser porque as circunstâncias mudaram e demandam uma atitude ou ação diferente.

Mas se as circunstâncias mudaram, isso não significa necessariamente que Deus tenha mudado de idéia. Significa apenas que, como as circunstâncias mudaram, o relacionamento de Deus com a nova realidade é diferente. Porque as circunstâncias, e não Deus, mudaram.

A linguagem empregada nessas passagens é chamada antropomórfica (atribuir características humanas a Deus) e antropopática (atribuir sentimentos humanos a Deus). É semelhante a uma pessoa que, movendo-se de um lado para o outro, diga: ''Agora a casa está à minha direita'', e depois: ''Agora a casa está à minha esquerda''.

Essas afirmações não querem dizer que a casa se moveu. É que a linguagem, sob a perspectiva de alguém, está descrevendo que a pessoa mudou sua posição em relação àquela casa.

Quando Moisés disse que Deus se arrependeu, essa foi uma forma figurativa de descrever que sua intercessão teve êxito em mudar o relacionamento do povo de Israel com Deus (Êx 32:14); Em Gênesis, é dito que Deus estava satisfeito com a criação do homem (Gn 1:31); porém, não se agradou com o que o pecado fez com sua perfeita criação (Gn 6:3).

O debate pode seguir desse modo:

• ATEU:Como posso acreditar na Bíblia, se ela diz que Deus não se arrepende (Nm 23:19; I Sm 15:29), e nem muda (Ml 3:3; Tg 1:17; Hb 6:17), mas aqui nessa passagem diz que ele se arrependeu? Hahaha!

• REFUTADOR: Deus não muda. O que muda são as circunstâncias.

• ATEU: Mas aqui está dizendo que ele se ARREPENDEU. Está cego?

• REFUTADOR: Primeiro, para Deus mudar, ele tem que ir de um ''antes'' para um ''depois'', para que possa se falar em mudança. Mas ''antes'' e ''depois'' são características temporais. Deus É eterno e está fora do tempo, por isso ele não pode mudar. Segundo, a palavra ''arrepender'' pode ser apenas uma expressão idiomática hebraica, descrevendo uma ocorrência sob perspectiva e linguagem humanas. Vá arranjar um argumento melhor.

Também pode seguir com o argumento (b):

• ATEU: Como posso crer no seu D-us, se ele se arrepende! D-uzinho imprevisível esse seu! Por isso eu acredito que ele não existe. Hahaha!

• REFUTADOR: Deus não se arrepende. Isso pode ser simplesmente uma expressão idiomática hebraica. E, me explique uma coisa: qual regra lógica você usa para ir de ''(a) Deus se arrepende e é imprevisível'', portanto ''(b) Deus não existe''? Me fale mais sobre esse seu raciocínio...

• ATEU: Ah... é... mas eu não vi evidências para a existência de Deus!

• REFUTADOR: Não mude de assunto, espertinho!

E por aí vai.

Conclusão:
Esse é um tipo de artimanha muito comum em debates com ateus. É só mostrar a ele que mudança exige tempo, melhorias e aquisição de novas informações, e que nenhuma dessas coisas se aplica a Deus, sendo ele eterno, perfeito e sábio. Deus não muda, nem de idéia, nem de vontade; sua natureza é imutável.